Uma vez mais, meu nome é Gianpaolo Celli e eu sou escritor, editor e parecerista profissional e aqui no Aliteração, hoje, eu vou falar de PORQUE A FICÇÃO NACIONAL NÃO VENDE.
Após ir a um evento literário e o assunto alguns dos participantes levantarem a lebre, eu resolvi trazer o mesmo à baila.
Eu nem vou comentar algumas críticas que li que comparavam livros de não-ficção – cuja predominância é nacional, cuja demanda, segundo eles, se aproxima mais da procura – com os de ficção. Isso é um erro crasso. Os mercados são diferentes e se comportam de maneira distinta!
E não só porque temos biografias como a Nada a Perder, do Bispo Edir Macedo – claramente uma exceção e não uma regra – que desequilibram a balança, mas também porque o público que busca entretenimento na literatura de ficção é influenciado por seriados e filmes, em suas maiorias importados.
Outro erro é a generalização do autor de ficção nacional, que eles dizem não vender devido a um academicismo exacerbado. Dentro do rótulo ‘ficção’ existem inúmeros subgêneros diferentes, e colocá-los sob um mesmo paradigma não é só um erro como também levanta uma questão:
Se a obra foi publicada ela passou, ou deveria ter passado pelo crivo de um editor. Assim, cabe a ele também, assim como à editora a responsabilidade em relação a esta inadequação.
Além disso, a esse caos todo se agrega o preconceito que sofrem alguns gêneros, erroneamente estigmatizados como “subliteratura”. E pior, pois em alguns destes se aceita a “subliteratura” importada quando, por preconceito e ignorância, se crítica e nega a nacional.
Por exemplo, os mesmos analistas que colocam que a literatura deveria se adaptar a seu público, criticam o autor nacional de colonialismo por fazer uma fantasia usando como base figuras mitológicas europeias ao invés de nacionais. Ora, mas como vimos acima, não é isso que o público quer ler?
E como eles não têm coragem de atacar escritores renomados, convenientemente ignoram que, por exemplo, George R. R. Martin, autor da série de fantasia Crônicas de Gelo e Fogo, é americano, país que, como o Brasil tem uma mitologia própria a qual ele não usou. Outro exemplo é a autora de vampiros Anne Rice que não tem ligação alguma com a Europa Oriental, de onde vêm as lendas originais. Será que por isso eles não poderiam escrever sobre o tema?
Para falar a verdade, Bram Stoker e Sheridan Le Fanu – autores de Drácula e Carmilla, respectivamente, dois clássicos da literatura vampiresca – eram irlandeses. Ou seja…
O interessante é que, para ajudar, a situação do mercado relativo ao tema é díspar.
Por um lado, temos um mercado mundial em franco crescimento, inclusive contando com a ajuda do cinema e da TV, com adaptações como as séries The Witcher e House of Dragons poe exemplo.
Até porque desde pelo menos Entrevista com o Vampiro (1994) que livros de literatura fantástica são, normalmente com sucesso, adaptados para o cinema e para a TV, de modo que as mídias se retroalimentam.
Por outro temos um mercado nacional de literatura restrito e, como colocado acima, preconceituoso ao aceitar obras internacionais, mas rejeitar as nacionais.
Por exemplo, um dos tópicos da conversa foi que um leitor havia comentado numa rede social que, apesar de estar lendo e gostando de um grande autor de literatura fantástica nacional, não se arriscaria com outros, pois “sabia” que ‘os autores nacionais são ruins’.
Agora o contrário também acontece (não do preconceito, mas da crítica em relação a qualidade do autor nacional ter sua razão), pois num evento que participei um dos palestrantes disse com todas as letras que “eles tinham que mostrar que a literatura nacional é boa, pois os autores brasileiros também eram alfabetizados”.
Fala sério! Ser alfabetizado não tem nada a ver com saber escrever PROFISSIONALMENTE. Este é um requisito mínimo! Seria como alguém aparecer numa escuderia de Fórmula 1 e dizer que porque tem carteira de motorista está habilitado a pilotar um carro de corrida.
Vejam bem. Se por um lado é errado comparar o mercado nacional com o dos livros importados que são traduzidos – que está longe de ser o mercado internacional, pois como eu já coloquei acima, eles não são um exemplo do mercado – também temos de considerar que, mesmo publicadas algumas obras nacionais muitas vezes tem uma qualidade abaixo do esperado, em especial quando falamos de literatura fantástica, com personagens clichê, histórias batidas, universos de fantasia copiados de outras obras, só para citar alguns exemplos.
Deste modo, uma vez mais temos de considerar que os editores devem levar parte da culpa em relação a isso. Eu mesmo já recusei originais considerados por seus autores como ‘prontos’ e cuja qualidade era bastante questionável.
Além de tudo isso, também temos que considerar a falta de verba com Marketing que as editoras destinam às obras de literatura nacional como causa das baixas vendas. E se isso é verdade para editoras grandes, para as pequenas…
Tudo bem que se pode dizer que atualmente, com a internet, as redes sociais, os blogs, está muito mais simples fazer marketing sem gastar dinheiro, mesmo assim é complicado tentar bater contra uma produção internacional, que além de já ser conhecida, de já ter um posicionamento de mercado determinado, muitas vezes conta com a ajuda de elementos externos, como séries e filmes, como marketing. Até porque esse marketing online não possui comprovação de resultados.
A conclusão que podemos tirar de toda essa argumentação é que:
Para combater esse preconceito VOCÊ autor nacional deve SE PROFISSIONALIZAR, fazendo seu trabalho sempre melhor e focado em seu público.
As editoras, por sua vez, devem deixar de acharem que o marketing deve ser feito pelo autor e melhorarem a divulgação das obras nacionais nas quais estão apostando, de modo a fazer com que elas e seus autores se tornam conhecidos.
E o público por sua vez deve deixar de lado esse preconceito e tentar ler o autor nacional.
Assim, independente de que parte da equação você se encontre, mude. Pois só assim conseguiremos mudar o mercado.